De uma
hora para outra (na virada de julho/agosto), algumas de nossas principais
estradas amanheceram bloqueadas por grupos de caminhoneiros: surpresa geral!
Surpresa
porque, descobriu-se ao longo do processo, o motivo alegado era a entrada em
vigor de uma lei (Lei nº 12.619/12; já batizada de “Lei do Motorista” –
caminhões e ônibus; e “Lei do Descanso”).
Surpresa também para a imprensa, boa
parte dela pega de calças curtas: tratou como greve uma paralização de
categoria que, na carga, é majoritariamente autônoma (algo mais para locaute);
e, reproduzindo velhos bordões, fez crer que entidades dos empresários estariam
por trás do movimento.
Em poucos dias a normalidade voltou; mas sem que tivesse
ficado totalmente claro, para a população, nem porque começaram os bloqueios,
nem porque eles foram suspensos; se a suspensão era definitiva ou transitória.
Novos bloqueios são anunciados para este setembro...
Mas como?
Além de ser lei, não teve ela longa tramitação no Congresso Nacional? Não houve
inúmeras audiências públicas Brasil afora? Não teve o apoio das áreas técnicas
dos diversos ministérios envolvidos? Do Ministério Público? Sua aprovação não
contou, surpreendentemente, com o apoio das principais entidades de empresários
e trabalhadores? Enfim: Por que, agora, resistências à sua implementação?
O aspecto
mais visível da Lei é a limitação da jornada diária de trabalho (com certa
flexibilidade) e a exigência de intervalos (entre jornadas e ao longo dela).
Isso, visando à redução, nas estradas brasileiras, do número de acidentes (mais
de 400 mil/ano, só os com vítimas), acidentados (quase 700 mil) e mortes (cerca
de 40.000: dobrou em uma década!); números alarmantes, padrão de guerras civis
em outros países! De novo, surpresa: Se o objetivo é nobre, se a saúde dos
motoristas rodoviários, e a segurança destes e dos usuários das estradas, em
geral, serão, evidentemente, beneficiados, como se colocar contra? Como se cogitar
de não leva-la à prática? Mas lógico, como diz o caipira, “debaixo do angu tem
carne...”.
Lógico:
Sem pontos de apoio, ao longo dos 1,5 milhão km de nossa malha rodoviária (mais
de 200 mil pavimentados), tais intervalos podem se tornar uma tortura... ou oportunidade
para malfeitos. A Lei aprovada fazia tal exigência... que acabou sendo um dos
19 vetos - uma dificuldade a mais para sua implementação. Faz sentido, assim, o
pleito de motoristas, dirigentes e empresários de transporte; assim como seus
alertas sobre a necessidade de programas para capacitar um enorme contingente
de novos motoristas, que serão necessários para suprir a redução de jornada
(mais de 100 mil, estima-se): Incentivo aos jovens (hoje desiludidos com a
profissão, apontam pesquisas) + treinamento.
Lógico;
também: Se a frota de caminhões brasileira não fosse, em média, tão antiga
(mais de 16 anos); se houvesse efetivo controle da carga dos veículos (para
coibir o sobrepeso); se a jornada dos motoristas não fossem desumanas 12, 14,
16, ou mais horas, dias seguidos; certamente a sinistralidade e morbidade, as
despesas hospitalares, previdenciárias e com manutenção das estradas, entre
várias outras, seriam menores; assim como os prêmios de seguro também poderiam
ser reduzidos. Mas “os fretes vão crescer” (de 15% a 40%, estima-se); brandem
aqueles que o pagam diretamente: os embarcadores, em geral; os de commodities,
em particular (que têm preços fixados pelo mercado internacional e, assim,
pequena margem para ajustes). Procede, pois, o alerta dos embarcadores.
Todavia, importante também se perceber que os fretes só são mantidos nos
patamares atuais porque terceiros, os contribuintes e a sociedade, como um
todo, acabam pagando parte da conta – discussão que, também, precisa vir à
mesa.
Entretanto,
tudo isso vale num primeiro momento; da mesma forma que a “perda de
produtividade”, alegada por alguns caminhoneiros: A boa notícia é que há espaço
para racionalizações no setor (cujos veículos rodam mais de 40% vazios: Europa
menos de 25%; USA menos de 20%!); e, também, para ganhos via intermodalidade.
E, no médio/longo prazo, ainda que complexo, há até espaço para transferência
de parte dos ganhos daqueles setores que terão redução de despesas. Ou seja: O
desafio (complexo, mas não impossível!) é ajustar-se/compatibilizar-se, no
tempo, ganhos e perdas; e entre os setores.
Ufa!
Felizmente! Grande alento e subsídio para se enfrentar esse vergonhoso,
desumano e anti-econômico status quo. Mas, sua efetivação, requer um bem
articulado plano de ação; diligentemente implementado e meticulosamente
monitorado. Algumas sugestões:
i) Fugir
da esparrela do sim/não, do tudo/nada, em direção a uma estratégia gradualista
(ações desde já, mas “mais prazos”, como reivindicam motoristas, empresários do
setor e embarcadores);
ii)
Acabar com o jogo-de-empurra; assumir-se (se possível revendo-se o veto!) e
configurar-se uma rede de apoio (com segurança, higiene, atividades, etc.) a
ser progressivamente implantada: por que não ter seu embrião na Rede do
Sest/Senat (quase 150 unidades) e um conjunto selecionado da vasta rede de
postos de combustíveis (mais de 39.000) – eventualmente com agregação,
subsidiada, de áreas contíguas?;
iii)
Desenvolver programas de incentivo, recrutamento e treinamento de jovens
profissionais;
iv) Deslocar
o foco da infraestrutura viária para a logística, efetivamente, visando maior
racionalidade;
v)
Conceber mecanismos tanto para compensar, no tempo, perdas/ganhos, como para
financiar os investimentos necessários via transferência dos ganhos dos setores/atividades
beneficiadas;
vi) Por
que não desenvolver-se mecanismos de “frete certificado” (na trilha do já
adotado para madeira, carne, agora energia ... algo que muitas empresas do
setor não teriam dificuldades para implantá-lo de imediato)?
Ou seja:
Há o que ser feito. Os benefícios são imensos e inadiáveis ... as dificuldades
muito grandes - mas não intransponíveis; e não podem/devem ser aceitas como
pretexto para que essa seja (mais uma) lei “que não pega”!
Fonte.: Frederico Bussinger - PORTO GE