O movimento de caminhoneiros, que nos últimos dois dias paralisou
estradas em pelo menos dez Estados, tem dividido entidades representantes do
setor e é pano de fundo de uma polêmica em torno da lei que, desde abril do
ano passado, regulamenta a profissão de motorista.
De acordo com levantamento da "Agência Brasil",
caminhoneiros realizaram protestos e fecharam rodovias importantes em nove
Estados ontem: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio
Grande do Sul, Bahia, Paraná, Mato Grosso e Rondônia. O movimento foi mais
fraco do que o da segunda-feira. Em vários Estados, a Justiça concedeu
liminar à União contra o bloqueio das estradas, estabelecendo multas para o
organizador do protesto, o Movimento União Brasil Caminhoneiro (MUBC).
Os quase dez dirigentes sindicais que estiveram ontem em Brasília
reunidos com representantes da Casa Civil afirmam que o MUBC está isolado no
comando dos protestos e paralisações. Dizem que o movimento deflagrado no
começo da semana é empresarial e que Nélio Botelho, presidente do MUBC,
possui uma frota com cerca de mil caminhões e presta serviços à Petrobras.
"Ele quer se aproveitar das manifestações que aconteceram nas
últimas semanas, que achamos justas, para defender a pauta dos
empresários", afirma José Araújo "China", presidente da União
Nacional dos Caminhoneiros do Brasil (Unicam), que representa dois milhões de
caminhoneiros - 1,2 milhão autônomos e 800 mil celetistas. "China"
disse que Botelho é a favor da proposta de revogação da Lei 12.619/12, que
regulamenta a profissão de motorista, principalmente em relação à duração da
jornada de trabalho. Ela foi sancionada em abril do ano passado e desde então
está sendo debatida na Câmara dos Deputados, em comissão especial presidida
por Nelson Marquezelli (PTB-SP), integrante da bancada ruralista.
A norma atual é criticada por diversos setores. Empresários do
agronegócio afirmam que a lei inviabiliza o escoamento da produção rural, já
que os motoristas estão dirigindo menos horas. Entidades de caminhoneiros,
por sua vez, argumentam que as rodovias não têm infraestrutura adequada para
descanso dos profissionais. A lei exige 30 minutos de pausa a cada quatro
horas na direção. Os cegonheiros pedem melhorias nos locais de repouso, e os
patrões querem autorização para trafegar à noite em pistas simples.
No mês passado, o deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), relator da
comissão, propôs a revogação da lei e sua substituição por um anteprojeto,
que estende de quatro para seis horas o período máximo que os caminhoneiros
podem conduzir sem descanso. Caso a proposta seja aprovada pelo Congresso, as
punições já aplicadas ficarão sem efeito.
"China" afirma que a categoria já propunha
"ajustes" no texto desde que ele fora aprovado, mas é contra a
revogação. Entre as mudanças, diz, está a redução do intervalo obrigatório de
11 horas entre jornadas, considerado prejudicial aos motoristas autônomos.
Paulo João Estausia, presidente da Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Transportes (CNTT), ligada à CUT, também disse não apoiar as
paralisações, que chamou de "movimento patronal" e
"locaute". Ele apoia a chamada "Lei do Descanso" e afirma
que, devido a jornadas exaustivas, os motoristas de caminhão estão envolvidos
em um terço das mortes em estradas brasileiras. A Nova Central também esteve
na reunião de ontem na Casa Civil e se colocou contra as paralisações.
O ministro dos Transportes, César Borges, informou ontem, após reunião
com entidades contrárias às paralisações, que as reivindicações do movimento
são "impossíveis" de atender.
O MUBC convocou as paralisações através de seu site e pede a concessão
de subsídios no preço do óleo diesel, a isenção do pagamento de pedágios em
todas as rodovias do país, a criação de uma Secretaria do Transporte
Rodoviário de Cargas e a votação e sanção imediata do projeto de lei que,
segundo a entidade, "aprimora" a Lei do Caminhoneiro.
A paralisação bloqueou a rodovia Castello Branco, em São Paulo, por 15
horas na segunda-feira. Um trecho da Cônego Domênico Randoni, rodovia que dá
acesso ao porto de Santos, foi fechado por mais de 24 horas e liberado após
intervenção da Polícia Rodoviária. Botelho, procurado pela reportagem, não
atendeu ao pedido de entrevista.
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Fonte.: Valor Econômico
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