quinta-feira, 4 de julho de 2013

Protesto nas estradas reflete divisão sobre lei


O movimento de caminhoneiros, que nos últimos dois dias paralisou estradas em pelo menos dez Estados, tem dividido entidades representantes do setor e é pano de fundo de uma polêmica em torno da lei que, desde abril do ano passado, regulamenta a profissão de motorista.

De acordo com levantamento da "Agência Brasil", caminhoneiros realizaram protestos e fecharam rodovias importantes em nove Estados ontem: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Bahia, Paraná, Mato Grosso e Rondônia. O movimento foi mais fraco do que o da segunda-feira. Em vários Estados, a Justiça concedeu liminar à União contra o bloqueio das estradas, estabelecendo multas para o organizador do protesto, o Movimento União Brasil Caminhoneiro (MUBC).

Os quase dez dirigentes sindicais que estiveram ontem em Brasília reunidos com representantes da Casa Civil afirmam que o MUBC está isolado no comando dos protestos e paralisações. Dizem que o movimento deflagrado no começo da semana é empresarial e que Nélio Botelho, presidente do MUBC, possui uma frota com cerca de mil caminhões e presta serviços à Petrobras.

"Ele quer se aproveitar das manifestações que aconteceram nas últimas semanas, que achamos justas, para defender a pauta dos empresários", afirma José Araújo "China", presidente da União Nacional dos Caminhoneiros do Brasil (Unicam), que representa dois milhões de caminhoneiros - 1,2 milhão autônomos e 800 mil celetistas. "China" disse que Botelho é a favor da proposta de revogação da Lei 12.619/12, que regulamenta a profissão de motorista, principalmente em relação à duração da jornada de trabalho. Ela foi sancionada em abril do ano passado e desde então está sendo debatida na Câmara dos Deputados, em comissão especial presidida por Nelson Marquezelli (PTB-SP), integrante da bancada ruralista.

A norma atual é criticada por diversos setores. Empresários do agronegócio afirmam que a lei inviabiliza o escoamento da produção rural, já que os motoristas estão dirigindo menos horas. Entidades de caminhoneiros, por sua vez, argumentam que as rodovias não têm infraestrutura adequada para descanso dos profissionais. A lei exige 30 minutos de pausa a cada quatro horas na direção. Os cegonheiros pedem melhorias nos locais de repouso, e os patrões querem autorização para trafegar à noite em pistas simples.

No mês passado, o deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), relator da comissão, propôs a revogação da lei e sua substituição por um anteprojeto, que estende de quatro para seis horas o período máximo que os caminhoneiros podem conduzir sem descanso. Caso a proposta seja aprovada pelo Congresso, as punições já aplicadas ficarão sem efeito.

"China" afirma que a categoria já propunha "ajustes" no texto desde que ele fora aprovado, mas é contra a revogação. Entre as mudanças, diz, está a redução do intervalo obrigatório de 11 horas entre jornadas, considerado prejudicial aos motoristas autônomos.

Paulo João Estausia, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes (CNTT), ligada à CUT, também disse não apoiar as paralisações, que chamou de "movimento patronal" e "locaute". Ele apoia a chamada "Lei do Descanso" e afirma que, devido a jornadas exaustivas, os motoristas de caminhão estão envolvidos em um terço das mortes em estradas brasileiras. A Nova Central também esteve na reunião de ontem na Casa Civil e se colocou contra as paralisações.

O ministro dos Transportes, César Borges, informou ontem, após reunião com entidades contrárias às paralisações, que as reivindicações do movimento são "impossíveis" de atender.

O MUBC convocou as paralisações através de seu site e pede a concessão de subsídios no preço do óleo diesel, a isenção do pagamento de pedágios em todas as rodovias do país, a criação de uma Secretaria do Transporte Rodoviário de Cargas e a votação e sanção imediata do projeto de lei que, segundo a entidade, "aprimora" a Lei do Caminhoneiro.

A paralisação bloqueou a rodovia Castello Branco, em São Paulo, por 15 horas na segunda-feira. Um trecho da Cônego Domênico Randoni, rodovia que dá acesso ao porto de Santos, foi fechado por mais de 24 horas e liberado após intervenção da Polícia Rodoviária. Botelho, procurado pela reportagem, não atendeu ao pedido de entrevista.

Fonte.: Valor Econômico