A Medida Provisória (MP) 595, que trata do marco regulatório do setor
portuário, está desde quinta-feira da semana passada na mesa da presidente da
República, à espera da sanção. Logo após a conclusão da votação da matéria no
Senado, o presidente Renan Calheiros (PMDB-AL) despachou a medida provisória,
transformada em lei, para análise do Palácio do Planalto. O texto original,
enviado pelo Executivo ao Parlamento, foi modificado pela Comissão Especial
do Congresso e, depois, na votação na Câmara dos Deputados. Com um prazo de
quase 14 horas para votar a análise da MP, sob pena de a matéria perder a
validade, o Senado iniciou a sessão pouco depois das 11 horas. Com o apoio da
base aliada, a medida foi votada em menos de 10 horas após o início da sessão
legislativa.
Caberá à presidente Dilma Rousseff, agora, sancionar a medida
provisória até 5 de junho. De acordo com a Casa Civil, o prazo começou a
contar na quinta-feira, dia 16, quando a presidência da República recebeu o
texto, e o feriado de Corpus Christi, no dia 30 de maio, será contado como
dia útil. Por lei, o presidente da República tem 15 dias úteis para sancionar
ou vetar o texto aprovado pelo Congresso. Caso Dilma vete alguns dos pontos
incluídos no texto original da MP, esses vetos retornam ao Congresso para
análise em sessão conjunta da Câmara e do Senado. “O veto é uma prerrogativa
da presidente. Eu espero que, caso a presidente Dilma resolva vetar, faça o
mínimo possível”, ponderou o 2º vice-presidente do Senado, Romero Jucá (PMDB-
RR). Ele acrescentou que, se for o caso, caberá ao Congresso a palavra final,
quando terá 30 dias para analisar e votar eventuais vetos presidenciais.
A aprovação da MP ocorreu apesar dos protestos da oposição e do risco
de a votação ser interrompida por decisão da Justiça. O Senado concluiu na
noite da quinta-feira a votação da medida provisória que altera a Lei dos
Portos, a menos de cinco horas do fim do prazo de validade da lei. Depois de
cerca de oito horas de debates na Casa, o projeto foi aprovado com 53 votos a
favor e apenas sete contrários, dando ao governo uma vitória importante.
Poucas horas antes, o texto fora aprovado na Câmara depois de 21 horas de
discussões, na mais longa sessão do Parlamento. Sem qualquer alteração no
conteúdo, o projeto seguiu para sanção da presidente Dilma, e a previsão é de
que receba vetos parciais.
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), determinou que a
matéria fosse votada no mesmo dia, sem considerar o acordo verbal de
interstício de 48 horas feito com os líderes ainda na gestão de José Sarney.
Segundo Renan, foi “a última vez” que o Senado apreciou uma MP sem que os
senadores tenham tempo para conhecer o conteúdo. Renan, no entanto, alegou já
haver publicado o texto e mandado aos senadores emergencialmente o seu conteúdo
para que tomassem conhecimento da medida. Para o relator da matéria no
Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), as quatro alterações feitas pela Câmara não
impediriam a apreciação pelo Senado. Segundo Braga, somente uma mudança no
seu texto foi “substancial”, a que pode levar à renovação automática dos
contratos de arrendamento de portos firmados após 1993.
No começo da tarde, com a sessão em andamento no Senado e debates
acirrados, líderes da oposição protocolaram um mandado de segurança no
Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar impedir a votação e pedir a
suspensão de seus efeitos, no caso de a MP ser aprovada. No mandado de
segurança, assinado pelos senadores José Agripino Maia (DEM- RN), Aloysio
Nunes Ferreira (PSDB-SP) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), a alegação é de que
a discussão do assunto na Câmara durou 20 dias (após a aprovação na comissão
mista do parecer de Eduardo Braga) e só depois disso houve a votação em
plenário. A atitude foi “casuística”, segundo os senadores. Eles argumentaram
que o tempo não era suficiente para analisar o assunto — especialmente porque
os deputados apresentaram 678 emendas à proposta.
O ministro Celso de Mello (STF) foi sorteado para relatar o mandado de
segurança, mas às 22h indeferiu a liminar. Na primeira votação sobre a medida
provisória, já ficou claro que a vantagem da base do governo no Senado seria
muito mais folgada do que foi na Câmara dos Deputados. O resultado da votação
de urgência para a apreciação do texto — um elemento regimental para permitir
a avaliação do mérito ainda na quinta-feira — foi de 48 votos a favor da
urgência, contra 12 da oposição. Pouco antes da proclamação do resultado
final, a presidente Dilma Rousseff ligou para Renan para agradecer os
esforços dos senadores peemedebistas para a aprovação do texto.
Entidades comemoram resultado
A MP dos Portos visa a modernizar os terminais brasileiros, ao
promover uma maior concorrência na movimentação de cargas e estimular
investimentos. O próprio governo estima que o setor, depois das mudanças,
pode receber R$ 54 bilhões, elevando a competitividade do setor e
contribuindo para a redução do chamado Custo Brasil. Uma das propostas é que
os terminais privados — que hoje só podem movimentar carga própria — possam
operar cargas de terceiros, acabando com a diferenciação entre portos
públicos e terminais privados. Esse ponto é um dos mais polêmicos, defendido
por grupos como o de Eike Batista, e criticado por empresas como a Santos
Brasil, de Daniel Dantas, e o grupo Libra — que passariam a enfrentar novos concorrentes.
Outro ponto é a possibilidade de renovação dos contratos assinados
após 1993, quando foi instituída a Lei dos Portos. A lei não indica
claramente a possibilidade de renovação. Sem essa garantia, as empresas
alegam que não eram estimuladas a investir sob o risco de perder as
concessões. Por isso, Santos Brasil e Libra defendiam que a nova MP
contemplasse a renovação antecipada dos contratos. Uma espécie de compensação
pelo fato de elas terem que enfrentar uma concorrência considerada desigual,
pois os concessionários pagam taxas que os usuários de terminais privados não
pagam.
A MP enfrentou ainda a oposição de trabalhadores avulsos — que têm
reserva de mercado em portos públicos — e envolveu objetivos políticos. Líder
do PMDB na Câmara, o deputado Eduardo Cunha (RJ) liderou a oposição à MP na
Casa, aglutinando uma série de emendas que quase inviabilizaram a votação da
MP dentro do prazo legal — que terminou na quinta-feira da semana passada —
para que ela não caducasse. No fim das contas, o governo acabou contornando a
oposição, cedendo em alguns pontos como o da permissão para renovação dos
contratos pós-93. Acredita-se, porém, que a presidente Dilma Rousseff vai
vetar algumas emendas.
Para os empresários, a aprovação da MP dos Portos no Congresso foi
interpretada como uma oportunidade de retomar investimentos no setor.
Classificada como um fator fundamental para recuperar a competitividade do
País, especialistas lembram que o Brasil ainda ocupa a 135ª posição no
ranking de eficiência portuária de 144 países organizado pelo Fórum Econômico
Mundial.Para Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo (Fiesp), a aprovação da MP dos Portos é essencial para a
competitividade do País. “A medida permite aumentar a oferta de operadores,
promovendo maior concorrência e a consequente redução de custos portuários”,
disse.
Apesar dos elogios, Skaf defendeu que a presidente Dilma resgate as
medidas propostas originalmente pelo governo e que foram alteradas por
emendas parlamentares durante a tramitação na Câmara. “A presidente pode
restabelecer, com vetos, o espírito original da medida provisória, criando as
condições para a imediata abertura de licitações dos mais de 50 contratos
vencidos usando o critério de menor tarifa combinado ao de maior volume de
carga. O Brasil está pedindo um choque de competição”, disse Skaf.
Para Wagner Cardozo, gerente executivo de Infraestrutura da
Confederação Nacional da Indústria (CNI), a MP permitirá a eliminação de
distorções no setor que só existem aqui, como restrições para os terminais
movimentarem só cargas próprias ou de terceiros. Outro ponto importante,
observou, será a revogação da Lei dos Portos, de 1993, e, junto com ela, do
Decreto 6.620/2006, que restringia investimentos em terminais privados. “O
governo está ciente de que os terminais públicos hoje estão cercados pelas
cidades e têm poucas áreas para expansão. E a MP chama as empresas privadas
para investir em novos projetos em outras áreas, e para competir com os
terminais públicos, que estão saturados e são caros”, afirmou.
Cardozo lembrou também que nos últimos anos a movimentação de carga no
País tem crescido a uma taxa média de 7% ao ano, enquanto nos últimos dez
anos o espaço nos portos para a movimentação de carga avançou apenas 5%. “Com
a carga crescendo sem espaço novo nos terminais ocorrem os congestionamentos
a que temos assistido e, pior, o aumento de custos para as empresas”, disse.
O executivo da CNI não vê problema no fato de a MP deixar uma série de pontos
em aberto para serem regulamentados posteriormente pelo governo. “A MP é boa
porque abre o setor à iniciativa privada, depois vem a regulamentação e
outros ajustes.”
A Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib)
também divulgou uma nota elogiando a aprovação da MP. “No médio prazo, e
atendendo ao planejamento e às políticas públicas do estado brasileiro, a
construção de mais terminais portuários privados poderá resultar em mais de
R$ 50 bilhões em investimentos. É uma correia de transmissão de crescimento
econômico, competitividade da economia e geração de empregos e oportunidades
em diversas regiões do País”, disse a Abdib, sem mencionar em que prazo esse
montante de investimentos se concretizaria.
A liberdade que a nova regulamentação dá aos investidores privados
também foi comemorada pela Abdib. “A nova legislação retira barreiras para
fazer fluir o investimento privado em novos terminais ao longo da costa
brasileira, criando condições para atender à demanda de diferentes polos
produtivos que se desenvolvem pelo interior do Brasil”, afirmou a Abdib.
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Fonte.: Jornal do Comércio/RS
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