terça-feira, 17 de julho de 2012

Motorista vai pagar pedágio até em trecho urbano de rodovias


A cobrança eletrônica de pedágio, que o governo de SP vai implantar nas rodovias privatizadas, levará milhões de motoristas a pagar para circular até nos entornos das cidades, onde as estradas são usadas como vias urbanas.

Entre os trechos de tráfego urbano que serão pedagiados estão, por exemplo, aqueles que ligam a capital paulista ao aeroporto de Cumbica (rodovia Ayrton Senna), a São Bernardo (Anchieta) e a Cotia (Raposo Tavares).

Hoje, eles não têm praças de pedágio, mas o deslocamento gratuito vai acabar por conta da instalação dos pórticos ao longo da via, que vão ler chips nos carros para fazer a cobrança.

No teste que está sendo feito na SP-75, entre Indaiatuba e Campinas, há um pórtico a cada 8 km. Com esse intervalo, as vias serão praticamente 100% pedagiadas.

A implantação da cobrança, planejada para 2013 ou 2014, vai depender de um cálculo político difícil para o governador Geraldo Alckmin (PSDB): se, por um lado, o sistema é mais justo e permite reduzir a tarifa, por outro, vai cobrar de muito mais gente.

Nem a Artesp (agência de transportes do Estado) nem as concessionárias sabem quantos usam as rodovias sem pagar. O único estudo feito -e sempre citado como parâmetro- na Dutra, uma via federal, apontou que só 9% dos carros pagam pedágio.

Se o percentual for parecido nas vias estaduais, com o chip, deve multiplicar por dez o número de carros tarifados -foram 790 milhões em 2011.

"O ponto crítico, não tenho dúvida, é quem não paga e passará a pagar", afirma Karla Bertocco Trindade, diretora-geral da Artesp. Para ela, porém, o Estado não pode dizer "você paga e você não". "A questão é: usou, pagou."

Haverá impacto em dois casos: em rodovias que são vias urbanas ou metropolitanas e em ligações entre cidades onde hoje não há cabines.

Na primeira, estão os exemplos acima e outros, como o da rodovia Dom Pedro 1º, que liga Campinas a três shoppings, condomínios, à Unicamp e à PUC Campinas.

Na segunda, os trechos entre São Carlos e Araraquara (Washington Luís) e Limeira e Piracicaba (Anhanguera).

Em todas as rodovias, porém, haverá um "perde e ganha": alguns usuários pagarão menos e outros, que não pagam, passarão a pagar.

Um exemplo claro é a própria SP-75. Entre Indaiatuba e Campinas há uma praça, que cobra R$ 10,10. 

Com os pórticos, o valor cai para R$ 4. Na via, porém, quem roda entre Indaiatuba e Sorocaba não paga hoje, mas vai pagar.

Rota de fuga - Nos trechos urbanos, um efeito colateral deve ser a criação de "rotas de fuga". "Será um 'problemaço' porque o motorista tentará fazer sua rota por dentro da cidade", diz Horácio Augusto Figueira, consultor em transportes.

Para ele, que é favorável à cobrança por trecho "sob o ponto de vista da justiça", o aumento das rotas de fuga pode ser impedido se o preço por km rodado for baixo.

Ele cita o Rodoanel, que custa R$ 1,50 no trecho oeste. "As pessoas estão fugindo do Rodoanel? Não, cada dia tem mais movimento."

Usuários da rodovia Dom Pedro 1º já criticam a mudança. A pesquisadora da Unicamp Ana Lúcia Pinto mora em Campinas e percorre 13 quilômetros da rodovia para trabalhar todo dia.

"Acho o ponto a ponto justo, mas o uso em trecho urbano, na cidade, não acredito que deva ser cobrado."
O analista de sistemas André Wohlers usa a via duas vezes por semana, entre Campinas e Mogi Mirim. "Não tem justificativa a cobrança atingir áreas urbanas", afirmou.

O pesquisador Antonio Augusto, também da Unicamp, se diz favorável. "O pedágio é um mal necessário. Sou contra o preço abusivo, mas, se for proporcional, acho correto".

Instalação de chip terá que ser obrigatória - A iniciativa paulista de implantar o pedágio eletrônico pode ser facilitada com a obrigatoriedade da colocação de TAGs (chips) no país, prevista pelo Conselho Nacional de Trânsito para janeiro de 2013.

O mesmo TAG que será usado no Siniav (Sistema Nacional de Identificação Automática de Veículos) pode servir para a cobrança do pedágio eletrônico.

O Siniav vai rastrear a frota, identificar carros roubados, furtados e sem licenciamento, além de mapear o tráfego. Não se sabe quanto custará o TAG.

Um dos problemas no Estado será a fiscalização, já que não há barreira física para impedir a passagem de carros.

Porém, os pórticos devem ter leitores de placas, que flagrarão veículos sem chip. Passar pelo pedágio sem pagar rende multa de R$ 127 e cinco pontos na carteira. Os pedágios poderão ser pagos por meio de boleto, cartão de crédito, débito em conta ou no sistema pré-pago.

Governo diz que negociará 'pontos críticos' - Já enfrentando uma pequena "romaria" de prefeitos e entidades que estão fazendo pressão contra a cobrança por km rodado no Estado, o governo diz estar aberto a negociações em torno dos chamados "pontos críticos".

"O que não pode é não fazer [a cobrança eletrônica] por conta disso", afirma Karla Bertocco Trindade, diretora-geral da Artesp.

Entre as alternativas citadas por ela estão ajudar prefeituras a construir vias marginais para trânsito local, isentar a cobrança dentro dos limites do município e até repassar a gestão de trechos das rodovias para as prefeituras.

"O correto mesmo é o prefeito fazer uma via alternativa para quem for andar dentro do município. Não tem dinheiro? Ok, então o senhor mantenha essa que eu já fiz."

Para ela, a ampliação da base de pagantes, além de mais justa, vai permitir a redução das tarifas e propiciar mais investimentos, inclusive em marginais e vias alternativas nas cidades.

Outro ganho é o fim das cabines de cobrança, que viram obstáculo ao tráfego, principalmente em feriados.

Segundo ela, a ideia é que, até o final do ano, a Artesp já apresente ao governador um projeto de implantação em todo o Estado.

A ideia é começar em 2013, mas 2014 é ano de eleição para o governo e Alckmin será candidato -uma eventual nova tarifa pode causar efeito negativo na campanha.

Para Moacyr Servilha Duarte, presidente da ABCR (Associação Brasileira das Concessionárias de Rodovias), cobrar pedágio nunca é simpático. "O governador tem consciência de que é um problema político que tem de ser enfrentado", diz.

A ampliação de pagantes não significará mais lucro a concessionárias, já que elas são remuneradas por km. 
A arrecadação seria destinada a obras e à redução da tarifa.

Fonte: Folha de s.Paulo