terça-feira, 18 de setembro de 2012

Lei nº 12.619 (motorista rodoviário): ´Lei que pega´ ou não?


De uma hora para outra (na virada de julho/agosto), algumas de nossas principais estradas amanheceram bloqueadas por grupos de caminhoneiros: surpresa geral!

Surpresa porque, descobriu-se ao longo do processo, o motivo alegado era a entrada em vigor de uma lei (Lei nº 12.619/12; já batizada de “Lei do Motorista” – caminhões e ônibus; e “Lei do Descanso”). 

Surpresa também para a imprensa, boa parte dela pega de calças curtas: tratou como greve uma paralização de categoria que, na carga, é majoritariamente autônoma (algo mais para locaute); e, reproduzindo velhos bordões, fez crer que entidades dos empresários estariam por trás do movimento. 

Em poucos dias a normalidade voltou; mas sem que tivesse ficado totalmente claro, para a população, nem porque começaram os bloqueios, nem porque eles foram suspensos; se a suspensão era definitiva ou transitória. Novos bloqueios são anunciados para este setembro...

Mas como? Além de ser lei, não teve ela longa tramitação no Congresso Nacional? Não houve inúmeras audiências públicas Brasil afora? Não teve o apoio das áreas técnicas dos diversos ministérios envolvidos? Do Ministério Público? Sua aprovação não contou, surpreendentemente, com o apoio das principais entidades de empresários e trabalhadores? Enfim: Por que, agora, resistências à sua implementação?

O aspecto mais visível da Lei é a limitação da jornada diária de trabalho (com certa flexibilidade) e a exigência de intervalos (entre jornadas e ao longo dela). Isso, visando à redução, nas estradas brasileiras, do número de acidentes (mais de 400 mil/ano, só os com vítimas), acidentados (quase 700 mil) e mortes (cerca de 40.000: dobrou em uma década!); números alarmantes, padrão de guerras civis em outros países! De novo, surpresa: Se o objetivo é nobre, se a saúde dos motoristas rodoviários, e a segurança destes e dos usuários das estradas, em geral, serão, evidentemente, beneficiados, como se colocar contra? Como se cogitar de não leva-la à prática? Mas lógico, como diz o caipira, “debaixo do angu tem carne...”.

Lógico: Sem pontos de apoio, ao longo dos 1,5 milhão km de nossa malha rodoviária (mais de 200 mil pavimentados), tais intervalos podem se tornar uma tortura... ou oportunidade para malfeitos. A Lei aprovada fazia tal exigência... que acabou sendo um dos 19 vetos - uma dificuldade a mais para sua implementação. Faz sentido, assim, o pleito de motoristas, dirigentes e empresários de transporte; assim como seus alertas sobre a necessidade de programas para capacitar um enorme contingente de novos motoristas, que serão necessários para suprir a redução de jornada (mais de 100 mil, estima-se): Incentivo aos jovens (hoje desiludidos com a profissão, apontam pesquisas) + treinamento.

Lógico; também: Se a frota de caminhões brasileira não fosse, em média, tão antiga (mais de 16 anos); se houvesse efetivo controle da carga dos veículos (para coibir o sobrepeso); se a jornada dos motoristas não fossem desumanas 12, 14, 16, ou mais horas, dias seguidos; certamente a sinistralidade e morbidade, as despesas hospitalares, previdenciárias e com manutenção das estradas, entre várias outras, seriam menores; assim como os prêmios de seguro também poderiam ser reduzidos. Mas “os fretes vão crescer” (de 15% a 40%, estima-se); brandem aqueles que o pagam diretamente: os embarcadores, em geral; os de commodities, em particular (que têm preços fixados pelo mercado internacional e, assim, pequena margem para ajustes). Procede, pois, o alerta dos embarcadores. Todavia, importante também se perceber que os fretes só são mantidos nos patamares atuais porque terceiros, os contribuintes e a sociedade, como um todo, acabam pagando parte da conta – discussão que, também, precisa vir à mesa.

Entretanto, tudo isso vale num primeiro momento; da mesma forma que a “perda de produtividade”, alegada por alguns caminhoneiros: A boa notícia é que há espaço para racionalizações no setor (cujos veículos rodam mais de 40% vazios: Europa menos de 25%; USA menos de 20%!); e, também, para ganhos via intermodalidade. E, no médio/longo prazo, ainda que complexo, há até espaço para transferência de parte dos ganhos daqueles setores que terão redução de despesas. Ou seja: O desafio (complexo, mas não impossível!) é ajustar-se/compatibilizar-se, no tempo, ganhos e perdas; e entre os setores.

Ufa! Felizmente! Grande alento e subsídio para se enfrentar esse vergonhoso, desumano e anti-econômico status quo. Mas, sua efetivação, requer um bem articulado plano de ação; diligentemente implementado e meticulosamente monitorado. Algumas sugestões:

i) Fugir da esparrela do sim/não, do tudo/nada, em direção a uma estratégia gradualista (ações desde já, mas “mais prazos”, como reivindicam motoristas, empresários do setor e embarcadores);

ii) Acabar com o jogo-de-empurra; assumir-se (se possível revendo-se o veto!) e configurar-se uma rede de apoio (com segurança, higiene, atividades, etc.) a ser progressivamente implantada: por que não ter seu embrião na Rede do Sest/Senat (quase 150 unidades) e um conjunto selecionado da vasta rede de postos de combustíveis (mais de 39.000) – eventualmente com agregação, subsidiada, de áreas contíguas?;

iii) Desenvolver programas de incentivo, recrutamento e treinamento de jovens profissionais;

iv) Deslocar o foco da infraestrutura viária para a logística, efetivamente, visando maior racionalidade;

v) Conceber mecanismos tanto para compensar, no tempo, perdas/ganhos, como para financiar os investimentos necessários via transferência dos ganhos dos setores/atividades beneficiadas;

vi) Por que não desenvolver-se mecanismos de “frete certificado” (na trilha do já adotado para madeira, carne, agora energia ... algo que muitas empresas do setor não teriam dificuldades para implantá-lo de imediato)?

Ou seja: Há o que ser feito. Os benefícios são imensos e inadiáveis ... as dificuldades muito grandes - mas não intransponíveis; e não podem/devem ser aceitas como pretexto para que essa seja (mais uma) lei “que não pega”!

Fonte.: Frederico Bussinger - PORTO GE